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23 dez 2024, seg

Por que não estamos transformando o mundo em um paraíso aquático? A dessalinização já é possível e mais barata do que você imagina

Imagine um cenário onde cada país tem lagos artificiais brilhando sob o sol, com piscinas em cada esquina e plantações irrigadas com água pura e abundante. A ideia de transformar países em verdadeiros oásis parece estar ao nosso alcance, com a tecnologia de dessalinização evoluindo e tornando-se mais acessível a cada ano. Mas se isso é possível, por que ainda não estamos vivendo em um mundo onde a água doce flui sem limites?

A técnica de dessalinização, ou seja, a remoção do sal da água do mar para torná-la potável, já é realidade em várias partes do mundo. Países como Israel, Arábia Saudita e Austrália são exemplos de nações que têm explorado essa tecnologia com sucesso, mas a ideia de uma abundância global de água doce ainda parece um sonho distante. Vamos mergulhar nesse paradoxo e entender por que essa tecnologia ainda não está transformando o mundo como poderíamos imaginar.

A revolução da dessalinização: mais acessível do que nunca

A dessalinização já percorreu um longo caminho. Nos últimos 20 anos, o custo de dessalinizar a água caiu drasticamente. Em 1990, o preço era de cerca de 3 dólares por metro cúbico de água. Hoje, em países como Israel, a dessalinização de um metro cúbico de água já pode custar menos de 0,50 dólares. Esse avanço é fruto de inovações tecnológicas e da implementação de técnicas como a osmose reversa, que utiliza membranas semipermeáveis para separar o sal da água.

Em 2022, a maior usina de dessalinização do mundo, Ras Al-Khair, na Arábia Saudita, produziu 1 bilhão de litros de água por dia. Isso equivale a abastecer uma cidade com 3 milhões de habitantes. A tecnologia está provando ser viável em áreas com pouca água doce, mas mesmo com todo esse potencial, ainda há desafios que impedem uma expansão mais massiva.

A barreira da energia: será que vale a pena?

Embora a tecnologia esteja ficando mais barata, a dessalinização ainda é um processo que consome muita energia. Para produzir um metro cúbico de água, são necessários entre 2 e 6 kWh de eletricidade. Isso significa que, em regiões onde a eletricidade é cara ou limitada, a dessalinização pode não ser viável.

Uma das soluções que vem sendo estudada é a integração de energias renováveis, como solar e eólica, no processo de dessalinização. Israel já utiliza energia solar para alimentar parte de suas plantas de dessalinização, e o governo saudita também está investindo em soluções sustentáveis. No entanto, mesmo com essas alternativas, o custo energético ainda é uma barreira significativa.

E os impactos ambientais?

Outro fator que freia a expansão da dessalinização é o impacto ambiental. O processo gera uma quantidade enorme de salmoura – a água residual altamente concentrada em sal – que, se não for tratada adequadamente, pode causar danos aos ecossistemas marinhos. Em algumas regiões, como o Golfo Pérsico, onde já há grandes operações de dessalinização, a salinidade do oceano aumentou consideravelmente, afetando a biodiversidade.

Além disso, o processo também emite dióxido de carbono, agravando a pegada de carbono das nações que dependem dessa tecnologia. A indústria está estudando maneiras de minimizar esses efeitos, como usar a salmoura para a criação de sais industriais ou até para a agricultura, mas a questão ambiental ainda gera controvérsias.

A escassez de água é real?

Embora muitos países sofram com a escassez de água, o problema não está apenas na falta de fontes de água doce. Em muitos lugares, o problema real está na má gestão e distribuição da água disponível. Um exemplo alarmante é o Brasil, que possui cerca de 12% de toda a água doce do mundo, mas enfrenta crises hídricas em cidades como São Paulo, devido à má gestão e ao desperdício.

Investir em dessalinização para resolver esse tipo de problema sem antes corrigir as ineficiências no uso da água pode ser visto como uma solução temporária. A distribuição equitativa da água, investimentos em infraestrutura e a preservação de bacias hidrográficas são cruciais para qualquer solução sustentável a longo prazo.

O paradoxo da abundância: O que realmente falta?

Se a tecnologia está ficando mais barata e a escassez de água é uma ameaça global crescente, por que não estamos criando verdadeiros paraísos aquáticos em todo o mundo? A resposta pode não estar apenas nos fatores econômicos e ambientais, mas também em uma falta de visão e prioridade por parte dos governos e das indústrias.

Transformar países inteiros em oásis, com lagos artificiais e irrigação massiva, exigiria uma revolução não só tecnológica, mas também política. Precisaríamos de uma coordenação global de esforços, investimentos maciços e uma vontade política de fazer acontecer. Muitos países ainda estão presos a políticas conservadoras de gestão da água e, paradoxalmente, alguns sequer investem o suficiente em tecnologias que poderiam garantir o futuro hídrico de suas populações.

Um futuro de oásis aquáticos: utopia ou realidade?

A ideia de transformar o mundo em um paraíso aquático, com água doce em abundância, não é impossível, mas está longe de ser simples. A tecnologia está aí, mais barata e acessível do que nunca. No entanto, os desafios vão além da tecnologia. São questões políticas, ambientais e de gestão que precisam ser resolvidas.

Enquanto isso, países como Israel e Arábia Saudita continuam a demonstrar que a dessalinização pode ser parte da solução, mas ainda é uma peça em um quebra-cabeça muito maior. Um futuro onde lagos artificiais, piscinas e plantações verdes abundem depende da nossa capacidade de resolver esses problemas de forma coordenada e inovadora.

Quem sabe, daqui a algumas décadas, possamos ver o surgimento dos verdadeiros oásis globais. Até lá, a água continua sendo o recurso mais precioso do planeta – e, paradoxalmente, um dos mais mal geridos.

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